{Capítulo 3} : O Beijo da Morte

Livro : O Beijo da Morte
Autora : Judie Castilho
Capítulos : Capítulo 1




Capítulo 3
Maestria.


A garota que se virou chamou a atenção das duas.
Ela era bem bonita!
Sua pele tinha cor de um chocolate ao leite daqueles bem cremosos. Seu cabelo era na altura do ombro, castanho e com muitos, muitos cachos finos. Seus olhos eram negros e seus traços muito marcantes, fortes.

Ela parecia uma Deusa africana.

Assim que viu Donank, Shiva estampou em seu rosto um enorme e contagiante sorriso. Sem perceber, Donank, Haysla e Violyt sorriam junto com ela.
– Don, meu gostoso! Ela puxou Donank num abraço apertado, finalizando com uma mordidinha em seu pescoço.
Violyt desviou o olhar, ela não queria presenciar aquele tipo de intimidade.
Já Haysla estava achando graça. Ela gostou da atitude determinada da garota. Ela tinha a impressão que as duas poderiam ser grandes amigas.
– Nós não estamos sozinhos, Shiva. Donank a repreendeu, um pouco constrangido. – Eu só queria te apresentar minhas mais novas amigas.
– Hum, isso é bom! Eu adoro novas amigas.
– Eu sou Haysla, e esta é Violyt. Haysla se antecipou a Donank. Ela gostara da garota, mas percebera que ela tinha uma presença marcante e que era atirada e desinibida. Haysla não queria ficar para trás, então precisava mostrar sua força. Além disso, havia uma coisa que ela queria evitar.
“Don”. Ela enviou uma mensagem telepático a Donank.

Se os hestriáticos tinham telepatia em grau 1, então isso significava que eles não poderiam se comunicar mentalmente. Mas isso não era um problema para um ordeano. Um ordeano tinha o dom de enviar mensagens a todos os povos e recolher de volta as mensagens que eles tentassem lhe enviar. Não era como entrar na cabeça de alguém e ler seus pensamentos, eles apenas podiam recolher as mensagens que alguém queria que eles recolhessem.  

“Puxa! Isso é demais! Você pode me entender?” Donank pensou, sorrindo.
“Claro que posso. Mas pra isso eu nem precisava ser telepata, era só saber leitura labial. Você está mexendo os lábios enquanto pensa. Eu só queria te avisar para não mencionar meu sobrenome. Não responda nada, finja que nada aconteceu.”
“Desculpe, eu não sou bom nisso.” Donank, desta vez, não mexeu os lábios, apenas os retorceu um pouco.
“Eu percebi, e acho que todo mundo em volta também.”

– Oi, eu sou Shiva Rheenea. Shiva esticou as mãos para cumprimentar as duas, que retribuíram. – Mas e aí? Vocês são mestiças, né? Ordeanas e...
– Terráqueas, a princípio. Haysla respondeu.
– Terráqueas? Ou ordeanas e terráqueas? Porque eu nunca vi um terráqueo com esse olho tão ordeano.
– Ordeanas e terráqueas. Haysla respondeu, novamente entediada. Não sabia o que seria pior, dizer seu sobrenome e ouvir, você é a filha de Vryan Rhieavatre, ou ficar se explicando sobre sua origem mestiça e o porquê de seus olhos azuis. Ela voltava a sentir saudades da Terra, onde apenas possuía os olhos azuis mais incríveis que todos já tinham visto.
– Legal! Vocês conhecem a Terra?
– Bastante. A gente morou lá desde os 9 anos até alguns dias atrás.
– Puxa, que delícia! Eu acabei de voltar de lá. Juro que moraria lá amarradona!
– Você também foi com o pessoal do 4º AL? Donank perguntou, entusiasmado.
– Fui. Cara, foi o máximo! Eu nunca beijei tanto na boca na minha vida!
Violyt estranhou o comentário. Ela teve a impressão de que Shiva e Donank tinham algum tipo de rolo. Não entendia como Shiva podia fazer um comentário como aquele na frente dele.
Já Haysla nem se tocou disso. Ela estava novamente imaginando a delícia de um monte de alunos viajando juntos pra Terra. Ela já fazia planos em sua mente, imaginando como poderia ser uma guia muitíssimo interessante em uma excursão futura.
– Por que você não foi, Donank? Violyt perguntou. Ela já tinha reparado a cara de animação que esse assunto proporcionava a Donank, e ele já mencionara que desejara conhecer a Terra.
– Sem grana. Donank respondeu, dando de ombros.
– Shiva! Um grito alto no fundo da sala fez Haysla e Violyt pularem de susto.
– AH!! Shiva gritou, saindo correndo e pulando em seguida em direção à garota que havia gritado. – Noaha! Ai, que saudade...
As duas se abraçaram e começaram a rodar sem parar.
– Descemos! Descemos! A garota, que parecia uma japonesa bem japonesa, falou, ou melhor, berrou! Ela era baixa, tinha a pele amarelada e seu cabelo preto e liso era curto, bem repicado um pouco abaixo da orelha.
– Yeh! Descemos! Shiva berrou de volta.
– Como foi na Terra? Eu quero saber tudo!

Donank respirou fundo, voltado sua atenção para Haysla e Violyt.
– Acho que o papo agora vai longe. Vocês querem comer alguma coisa?
– Don, você não precisa ficar de babá pra gente, não. Haysla comentou. – Pode fazer suas coisas que a gente se vira.
Não que ela estivesse preocupada com o bem estar de Donank ou algo assim, ela apenas estava irritada com a possibilidade dele estar ali por pena delas não conhecerem ninguém. Não era admissível que alguém sentisse pena dela.
– Bem, a não ser que minha presença incomode vocês, eu adoraria continuar servindo de babá para as duas meninas mais lindas dessa escola.
Haysla e Violyt sorriram.
– É claro que sua presença não nos incomoda, Donank. Violyt lhe disse, ainda sorrindo. Ela estava, na verdade, muito feliz com a sua companhia.
– O que aquelas duas queriam dizer com aquele ‘descemos’ tão animado? Haysla perguntou, enquanto eles caminhavam para a mesa de comidas.
– Ah... Só que elas desceram mesmo. Desceram as escadas. Até o ano passado elas eram do BL, que fica no andar de cima, agora elas são do AL, que fica no andar de baixo.

Tanto Haysla quanto Violyt entenderam muito bem aquilo.
Não era uma questão de escadas. Era como ir do primeiro, para o segundo grau. Era meio que um tipo de status.

– Desculpe pela minha comunicação mental arcaica. Donank falou sorrindo para Haysla. – É que, além do Benjamim, quer dizer, do professor Thriskow, ninguém tinha feito aquilo comigo antes. Fui pego de surpresa.

Haysla já estava achando chata a onipresença deste professor Thriskow. Toda hora ela ouvia seu nome ou o de seu povo sendo comentado por alguém. E isto a incomodava demais.
Será que já não era suficientemente irritante que se pegasse pensando nele sem nenhum motivo aparente? Ainda precisavam lhe fornecer um motivo aparente?

Os três pararam em frente à mesa de comidas. Nem Haysla nem Violyt nunca tinham visto tanta comida junta. Eles se serviram de algumas guloseimas e foram se sentar em uma das mesas.
Depois que terminaram de comer, os três ficaram juntos por mais algum tempo, conhecendo algumas pessoas e jogando conversa fora.

Quando luzes começaram a piscar no teto, Donank disse que era hora deles seguirem para suas salas.
Ele explicou que as turmas eram classificadas por cores. Todos deveriam usar jalecos com as cores de sua turma e calça ou saia preta. Mas, no primeiro dia de aula isso era dispensável.
Haysla não gostou daquilo, ela não estava acostumada a usar uniformes, mas esperou que seu pai tivesse providenciado suas roupas e as de Violyt.
O 1º AL era amarelo e preto e, seguindo pelo corredor em frente ao refeitório, rapidamente elas identificaram a porta que continha aquelas cores, ao lado do escudo da União Universal.

O escudo era um círculo preto coberto de milhões de estrelas que brilhavam muito e uma espada dourada quebrada ao meio. O círculo maior representava a Uni Uni e, ao seu redor, se distribuíam 16 círculos menores entrelaçados, representando cada um dos planetas aliados. Letras prateadas distribuídas de forma circular em volta do grande círculo formavam as palavras União Universal. A espada quebrada significava que não havia mais lutas entre seus aliados.

As duas se despediram de seu novo amigo e seguiram para sua sala.

Elas ficaram aliviadas por haver uma mesa livre, para que pudessem sentar lado a lado. Shiva e sua amiga japonesa (claro que ela não era japonesa, mas elas não sabiam de qual planeta ela era, então a chamavam de japonesa mesmo), estavam sentadas na mesa em frente à delas. Além delas duas, elas não conheciam mais ninguém. Quase todas as pessoas que Donank as apresentou eram de turmas mais avançadas. Ele até explicou que conhecia todos os alunos novos, mas apenas por causa dos exames, não tinha intimidade com eles.
A conversaria ainda continuava a todo o vapor, com muitos alunos se levantando das cadeiras a toda hora, para visitar a mesa de alguém.

“Esse povo não conhece telepatia não?” Haysla perguntou, em seu típico modo rabugento.
“Conhecer eu acho que todos conhecem, mas acredito que nem todos possuam esse dom.” Violyt respondeu, sorrindo.  
“Pobres coitados! Eu não saberia viver sem isso. É um adianto e tanto.” Haysla acrescentou.

Alguns minutos depois a porta se abriu.

Haysla não acreditou no que seus olhos viram.

“Claro! Professor Benjamin Thriskow. Tinha que ser ele. Será que eles não tinham mais ninguém para dar a aula inaugural?”
“Pare com essa implicância, Hay. O cara não te fez nada. Lembra?”
“Eu não fui com a cara dele.” Haysla mentalizou, seguindo uma imagem dela estrangulando o cara enquanto dava gargalhadas eufóricas.
Não era exatamente verdade que ela não havia gostado dele, mas Haysla preferia pensar assim. Isso era mais fácil do que a verdade. A verdade era que aquele cara estava ocupando uma grande parte de sua mente.

– Deus do céu! Uma garota na mesa atrás da delas sussurrou. – Eu não acredito que chegou o dia em que a gente terá aula com ele. O homem mais lindo do universo!!! Tô passando mal.
– E eu não acredito que eu sou uma pliniana. Sussurrou outra voz na mesma mesa. – Que azar o meu!
– Bem, sorte a minha que eu sou uma trolk. Era a primeira voz novamente. – Posso fazer o que eu quiser com ele. A Guina, amiga do meu irmão, já ficou com ele, ela disse que não tem sensação no universo que se iguale a ter a ekliefina em sua boca.
– Já me falaram. Vou morrer sem sentir isso, a não ser que eu queira morrer disso.

“Você está ouvindo o papo das duas?” Violyt perguntou, curiosa.
“Não.” Haysla mentiu. “O murmurinho na sala está muito alto, não prestei atenção em nada em específico.”  
Haysla estava curiosa com aquela conversa. O que elas queriam dizer com ‘ser uma sensação boa ter a ekliefina na boca’? Mas, ao mesmo tempo, a incomodava ouvir as garotas desejando Benjamin e comentando sobre suas aventuras amorosas. Assim como a incomodava saber que se ela estivesse naquela conversa, também estaria com a parte do azar, e ela sempre queria a parte da sorte.
Violyt não comentou o assunto, imaginou que Haysla ouvira muito bem a conversa das garotas. Se não queria comentar, deveria ter seus motivos.

Benjamin encostou-se casualmente em sua mesa, cruzando os braços.
– Bom dia, turma! Ele falou em meio ao murmurinho. Mesmo sua voz sendo baixa e calma, seu tom era de uma autoridade tal, que todos ficaram quietos no mesmo instante. – Para quem ainda não me conhece, sou Benjamin Thriskow.
Aos novatos, bem vindos à Academia Frantila. Aos alunos antigos, bem vindos ao andar dos AL’ s. Ele disse sorrindo e abrindo os braços.
Sua voz era sempre suave, simpática e baixa, mas, ainda assim, conseguia ter uma autoridade muito explícita.
– Hoje eu estou aqui apenas para explicar o funcionamento da escola. Suas regras, nosso dia a dia, provas, eventos... Tudo o que vocês precisam saber sobre os AL’ s. Mas, antes, eu falarei... de mim. Benjamin respirou fundo antes de continuar. – Como eu acredito que todos vocês saibam, nem que seja pelos meus olhos amarelos, eu sou um Klyso. Provavelmente, o único que vocês verão em suas vidas. E antes de qualquer outra coisa, eu preciso explicar a questão da segurança. Não é muito simples estar ao lado de um Klyso, e eu acho que ser claro a respeito disso é o melhor caminho a se seguir.
Nós, os klysos, somos venenosos.
Para alguns, nosso veneno não possui efeito nenhum, mas para outros, é fatal.
Fora os mestiços, onde cada caso é um caso, para os wanianos, os vanikstáneos e os arkiniáquios, o nosso veneno é fatal se entrar em contado com o seu organismo. Mas como a pele destes povos é resistente ao veneno, um klyso pode encostar neles, sem problema. A não ser que eles tenham um corte ou uma ferida aberta, nosso veneno não consegue penetrar em suas peles. Sendo assim, isso não chega a ser um problema aqui, não atrapalha nossa relação professor/aluno. Mas... para os hestriáticos e os plinianos a situação é diferente. Suas peles não são resistentes ao veneno eklyesiáqueo. Isso significa que se eu não tiver nem uma gotinha de suor nas mãos e encostar num deles, nada ocorre. Mas se apenas uma única gota de suor estiver em minhas mãos quando eu encostá-los, o veneno presente no meu suor atravessa a pele e entra em seu organismo... e eles morrem. Não duram 10 minutos e não há antídoto, não há remédio...
Desculpem-me se eu estou sendo rude, mas esse assunto é muito sério pra eu tratar com eufemismos.
Benjamin respirou fundo novamente, virando seu olhar na direção de Haysla e Violyt, mas não era para elas que ele olhava, ele olhava para a mesa atrás delas.
– Nós não temos nenhum hestriático nesta turma e apenas um pliniano... apenas um pliniano puro. Sendo assim, eu vou me reportar diretamente a você, Srta. Bartillo.
Haysla e Violyt ouviram um suspiro vindo da mesa de trás.
– Pois não. A garota disse baixinho.  
– Você não me conhece, de modo que pedir que confie em mim, quando o assunto é sua vida, seria uma pretensão da minha parte. Mas talvez seja mais fácil querer que você confie na Academia Frantila. A direção desta escola jamais permitiria que eu lecionasse aqui se isso representasse o mínimo risco para qualquer um de seus alunos.
Benjamin olhava fundo nos olhos dela. Seu olhar era tão sério e forte que não poderia passar despercebido por ninguém.
– Os klysos possuem controle mental em grau 10, isso me permite tomar os cuidados necessários para este caso. Eu criei em minha mente um radar capaz e detectar a presença de um pliniano ou de um hestriático com uma precisão de 100% de segurança. Caso qualquer indivíduo destas duas espécies se aproxime de mim, um escudo é automaticamente lançado ao meu redor, sem eu nem mesmo precisar pensar neste assunto. Tudo isso se faz sozinho. De modo que eu gostaria que você, Srta. Bartillo, não se preocupasse com isso. Pode correr por esta escola sem medo de mim, se você e eu nos esbarrarmos em alguma curva, ou em qualquer situação, você nunca irá encostar em mim, de verdade, apenas no meu escudo. Além disso, nunca haverá uma única gota do meu veneno em lugar algum desta escola, eu garanto. Eu me preocupo com isso, Srta. Bartillo, para que você não precise se preocupar.
Leciono nesta escola há 11 anos e nunca tive nenhum acidente...
Não há possibilidade disto acontecer.
– Eu confio em você. A garota falou com a voz dengosa.
Benjamin abriu um sorriso, respirando aliviado.
– É só disso que eu preciso, de sua confiança. E eu sei que isso é pedir muito... Mas eu juro que cuido de você.
A garota deu um suspiro derretido, quase um gemido.

“Que idiota!” Haysla mentalizou para Violyt, “Parece que ela está recebendo uma declaração de amor.”
“Puxa, Haysla! Como você consegue ser tão fria?” Violyt rebateu, chocada. “O cara está todo desarmado, jurando que protegerá de si mesmo. Se você não reparou, eu e todas as outras meninas desta sala também suspiramos com ela. Foi lindo o que ele fez!” Violyt sentia pena de Benjamin. Não devia ser nada bom imaginar que as pessoas podiam sentir medo de você, que você poderia matar alguém com apenas um toque. Mas a atitude dele a encantou. Ela achou romântico e quase queria que tivesse sido com ela.
“Lindo? Você é tão romântica, Viol! O cara é um professor, ela é uma aluna e ele pode matá-la. Ele não faz mais que sua obrigação em protegê-la.” No fundo, no fundo, Haysla também achara a atitude dele legal. Não linda, não romântica, mas legal. Mas ela não admitiria isso. Benjamin mexia com ela e ela não estava gostando dessa história. Ele é um idiota exibido, tudo o que quer é se mostrar para as garotas. Se repetia o tempo todo.

– Obrigado pela confiança, Srta. Bartillo. Significa muito pra mim.
Benjamin assumiu uma postura mais despojada, levantando-se da mesa.
– Já que acabamos com os assuntos macabros... Nós, os klysos, não temos só coisas ruins, também podemos ser interessantes.

Ele levantou o indicador, apontando-o para a cadeira que estava atrás de sua mesa. Num segundo, a cadeira começou a levitar e, seguindo a direção indicada por seu dedo, passou por cima da mesa e desceu lentamente à sua frente, parando ao seu lado.
Ouviu-se ‘uaus’ e ‘uhus’ vindos de todos os cantos da sala.
Benjamin deu uma risadinha e sentou-se ao contrário na cadeira, apoiando os braços em seu encosto.

“Exibido!” Haysla chiou mentalmente para Violyt.
Violyt apenas sorriu. Ela estava se convencendo de que a implicância de Haysla só iria crescer. De que ela nem mesmo precisaria de motivos para criticar o pobre professor.

– Isso não foi nada! Benjamin disse, sorrindo mais abertamente.
“Exibido!” Haysla repetiu.
– Talvez vocês possam entender o porquê deu ter sido escolhido para ser o professor de Controle da mente. Entre os povos aliados, os klysos são o único com controle mental em grau 10, seguido dos wanianos, com grau 7. Depois disso o máximo é 5. Como eu sou o único klyso neste planeta, ninguém melhor do que eu para cuidar desta cadeira.
Benjamin exibia uma pretensão que Violyt achava divertida, mas que Haysla achava irritante.
– Na verdade, eu sou figurinha fácil por aqui. Além de Controle da mente, eu também dou aula de Telepatia e cuido do tópico Eklyeses na cadeira ‘Povos e culturas’, que é ministrada por vários professores diferentes. Fora algumas eletivas, mas estas vocês não pegam neste período.
Bem, eu continuarei explicando sobre cada matéria, sobre provas e mais vários assuntos que vocês acharão um saco ouvir. Mas vamos primeiro... Há! Benjamin deu um gritinho e fez uma cara divertida. – Falar sobre o que realmente interessa... Festas!
A galera riu e deu gritinhos bem mais altos que o dele.
Benjamin sorriu, ele parecia estar tão animado com aquilo quanto seus alunos.
– Temos muitas. O diretor Janguiah adora um barulho! A primeira será no próximo septino. O ‘Baile de boas vindas’.

O ano em Frantila tinha 385 dias, um pouco diferente do terrestre, e também era contado de maneira diferente. Para começar, ele tinha 14 meses, alguns com 27 dias, outros com 28. Um dia tinha também 24 horas. As semanas tinham 8 dias, 5 úteis e 3 livres, pelo menos para a escola, a maioria dos adultos trabalhava 6 dias por semana. Os dias úteis iam do seguno ao sextino, e os livres eram o septino, o octino e o prímino.

– Ele será realizado no salão principal aqui da Academia mesmo, e será cheio de regras...
A galera soltou um ‘ahh!!!’ desiludido.  
– Não esperam eu terminar de falar... Benjamin balançou o rosto, brincando com um tom de recriminação. – Até às 11 da noite. Depois disso todos os professores e autoridades se retirarão, menos eu... Eu ficarei responsável por vocês. E eu não tenho muitas regras.
A galera explodiu em gritos. Benjamin se divertia.
– Mas tenho algumas... Ele alertou.
Benjamin continuou a falar sobre cada festa que teriam na escola, cada prova, notas, matérias, regras e mais regras, período letivo, férias...
Os assuntos pareciam não ter fim e as horas se esticavam. Mesmo assim, os alunos não percebiam o tempo passar. Benjamin intercalava os assuntos chatos com piadinhas, brincadeiras, exemplos e citações curiosas... Ele fazia tudo parecer leve e divertido. Os alunos não ficaram desatentos nem por um segundo.

Um assunto em particular os agradou.
– É totalmente proibido ter contatos íntimos nas salas de aula. Mas... não temos regras que impeçam os alunos de namorem entre si nas outras áreas comuns da escola.
A gritaria foi geral!
– A gente não faria essa sacanagem com vocês, claro. Afinal, namorar é uma delícia! Ele fez uma expressão sexy ao dizer as últimas palavras. – Mas... para que a gente possa continuar permitindo isso, eu precisarei de uma ajudinha de vocês. Filtrem a intensidade, por favor. Benjamin juntou a palmas das mãos, como se estivesse rezando. – Nenhum amasso muito exagerado facilitaria meu trabalho e eu lhes seria eternamente grato...
Já o relacionamento físico entre alunos e professores, ou entre alunos e qualquer funcionário da Academia, é totalmente proibido...
Ouviu-se um coro de ‘ahhs’ vindo das vozes femininas da sala.

Haysla deu um sorriso debochado.
Ela se lembrava de Donank ter dito que o professor Thriskow gostava de dar uns pegas nas alunas. Talvez ele fosse bom em burlar suas próprias regras.

– Pelo menos dentro dos limites da escola. Ele acrescentou.
As meninas iniciaram uma série de suspiros aliviados e risadinhas baixas. Benjamin claramente tentava disfarçar o sorriso, mas um esboço dele lhe escapou. – O que acontece além dos muros da Academia Frantila, não é da conta da Academia Frantila. É da conta da Uni Uni, claro, mas a Uni Uni não possui regras a este respeito.
“Idiota!” Haysla mentalizou irritada para Violyt. “Só falta agora ele dar um número de telefone e avisar, ‘estou livre a partir das 8 da noite, marquem hora com a minha secretária, por favor.”
“Hay, ele não está falando só dele, isso vale para todos os funcionários da escola. É uma regra e ele a está comunicando.” Violyt mentalizou, sorrindo. A implicância de Haysla já estava até engraçada.
– Os monitores, apesar de serem também funcionários da escola e receberem por seus trabalhos, estão tão liberados como qualquer outro aluno.

Benjamin explicou mais e mais regras sem parar...

– Me chamem de Benjamin, por favor. Ele pediu, quando um aluno o chamou de professor Thriskow ao fazer uma pergunta. – Vamos combinar o seguinte, quando a gente estiver com algum outro professor, ou funcionário, vocês me chamam de professor Thriskow, ou apenas de professor. Mas quando estivermos só nós, eu sou só Benjamin. Ou só Ben.
Isso deixou os alunos ainda mais à vontade.

Violyt estava encantada com a maestria com que Benjamin conduzia a turma.
Era fácil entender o porquê dele ser o designado para a aula inaugural do 1º AL. Nenhuma outra turma tinha tantas coisas novas para assimilar, e nenhum outro professor poderia ser tão habilidoso ao fazer isso. Ela era capaz de jurar que cada aluno da sala havia decorado todas as vírgulas que ele citou, inclusive ela. Violyt estava animada com a perspectiva de ter muitas aulas com Benjamin. Suas aulas nunca poderiam ser chatas e ela desejava que todos os professores que teve na Terra tivessem sido assim.  

Já Haysla dividia seus pensamentos sobre ele entre a admiração e o encantamento, e a raiva e o desprezo. Toda vez que ela se pegava encantada com alguma tirada, ou algum sorriso dele, ela desviava rapidamente seus pensamentos para qualquer coisa de ruim que pudesse criar sobre ele.
Ela já nem percebia mais que estava fazendo isso.

Quando a aula inaugural terminou, a turma gritou um longo ah!!!
Ninguém parecia querer ir embora.
Benjamin fez mais algumas brincadeiras e, pouco a pouco, os alunos foram se levantando para sair.

“Srta. Rhieavatre...” Ele mentalizou para Haysla, antes que ela se levantasse também.
“Sim?” Ela respondeu, também mentalmente. As sobrancelhas cerradas.
“Poderia esperar um pouco, por favor? Eu preciso de um minuto de sua atenção.”
Benjamin mexia em alguns papéis enquanto se comunicava com Haysla. Ao mesmo tempo, ele se despedia dos alunos que saiam.
“É algum segredo?” Haysla perguntou, bastante deboche em sua voz mental.
– E aí, professor, como foram suas férias? Perguntou um garoto loirinho, bem branco e de olhos azul escuro.
– Oi Danine. Benjamin respondeu de forma simpática. – Minhas férias foram ótimas, fui pra casa. Saudades... E você?  
Exatamente no mesmo instante em que Benjamin conversava com o garoto, Haysla recebia mais uma mensagem telepática dele.
“Segredo nenhum, apenas acho mais apropriado falar só com você.”
Haysla não entendia como ele conseguia falar e conversar mentalmente, exatamente ao mesmo tempo. Ela quase esperou até que ele terminasse de conversar para continuar, mas não o fez. Queria testar as habilidades perfeitas do tal grau 10 de controle mental e desejava que ele se atrapalhasse.
– Também fui pra casa. Mas eu queria ter ido à Terra com a turma do meu irmão.
 “E ninguém podia saber que você queria falar comigo? Porque se podia, por que você não me chamou em voz alta?”
– Puxa, Danine, até eu queria ter ido nesta excursão para Terra. Não se fala em outra coisa neste colégio. Mas por que você não foi?
No mesmo instante em que dizia tais palavras, ele mentalizava para Haysla. “Eu apenas não tinha certeza se você gostaria que eu pronunciasse seu sobrenome em voz alta. Não sei se é de seu interesse que todos saibam de quem você é filha, por enquanto. E como eu não tenho autorização para te chamar pelo primeiro nome, achei que seria uma boa solução te chamar mentalmente.”
– Meu irmão encheu o saco dos meus pais para eles não me deixarem ir. Mas aposto que a turma dele te deixaria ir, se você quisesse.
Benjamin deu uma risada suave.
“Não, eu realmente não quero que saibam de quem eu sou filha. Pelo menos, ainda não.” Haysla admitiu, odiando ter que aceitar que o cara tinha uma boa percepção das coisas. “Você pode me chamar de Haysla.”
– Acho que você tem razão, eles deixariam. Mas não ligue para o seu irmão não, Danine, Dolde é um rabugento.
“Eu imaginei isso” Ele mentalizou em resposta. “Então, me concederá um minuto, Haysla?”
O garoto deu uma risada alta. – Ele é mesmo!
“Depende. Vai continuar com esse papo de importância vital para o universo por muito tempo? Porque eu tenho mais o que fazer.”
“Já o estou dispensado agora mesmo.”
– Pode dizer ao Dolde que eu o chamei de rabugento. Benjamin pôs as mãos nos ombros de Danine, conduzindo-o até a porta.
“O que você está esperando pra se levantar, Hay?” Violyt questionou, já parada de pé ao lado dela, quando percebeu que sua amiga não se mexia.
“Me espere lá fora. O professor quer falar comigo.”
– Posso? Danine perguntou, visivelmente empolgado.
– Claro. Benjamin respondeu sorrindo. – E diga que eu lhe mandei um recado, as garotas odeiam caras rabugentos.
“O que o professor Thriskow quer falar com você?” Violyt perguntou com a testa franzida.
“Se eu soubesse, ele não precisaria falar.” Haysla respondeu bem à sua maneira.
Benjamin se despediu do garoto, que saiu pelos corredores sorrindo.
“Ah, tá... já entendi. Tchau.” Violyt saiu da sala fazendo um gesto de cabeça ao cruzar com Benjamin.
“Não tomarei sua amiga por muito tempo. É só um minuto.” Ele mentalizou para Violyt, enquanto retribuía seu gesto de cabeça, acrescentando um sorriso a ele.
Haysla se levantou, recostando-se na mesa da frente.

“Pronto.” Ela mentalizou para ele, assim que ficaram sozinhos na sala. “Sou toda ouvidos.”

Benjamin sorriu para ela, recostando-se confortavelmente em sua mesa.